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PLANO PARA O NORDESTE

Em gestação na Câmara dos Deputados, o Plano de Desenvolvimento Científico e Tecnológico para o Nordeste já foi apresentado ao MCT e deverá ser exposto aos governadores da região no final do mês

O ponto central do debate recai sobre os melhores mecanismos para combater as desigualdades. O plano de desenvolvimento, relatado pelo deputado Ariosto Holanda (PSB-CE), parte da constatação de que o principal instrumento de desconcentração regional dos fundos setoriais - a vinculação de 30% dos investimentos a projetos das regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste - não tem funcionado plenamente.


Segundo cálculos do gabinete do deputado, em oito anos, essas regiões deixaram de receber R$ 578 milhões. A principal explicação reside nas dificuldades em atender a exigências dos editais nacionais.


Na avaliação de Holanda, o quadro de desigualdade só será revertido com mudanças nas "regras do jogo". Para ele, a lógica de chamadas públicas nacionais operadas pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) trata "igualmente os desiguais".


A principal proposta contida no termo de referência do plano - lançado em janeiro e apresentado ao ministro da Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende, em 2 de fevereiro - é a separação dos recursos dos fundos setoriais para projetos do Nordeste. O valor capitalizaria o futuro Fundo de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Nordeste (FDCTN), que ainda receberia aportes de emendas parlamentares e de outras fontes.


"Os recursos terão sua origem nos fundos setoriais federais, nos fundos estaduais, nas emendas ao orçamento da União e outros", diz o termo de referência. O texto dá a entender que até os recursos das Fundações de Amparo à Pesquisa (FAPs) seriam canalizados para o novo fundo. Mas, em entrevista, o deputado Holanda garantiu que não - segundo ele, haveria até a possibilidade de o futuro FDCTN reforçar o caixa das FAPs e induzi-las a investir mais.


As mudanças na "regra do jogo" propostas por Holanda incluem ainda a criação do Conselho de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Nordeste (CDCTN) e o aumento da ênfase na extensão tecnológica. O conselho seria o gestor do novo fundo, estabelecendo prioridades e definindo os projetos a serem apoiados. Presidido pelo ministro da Ciência e Tecnologia, nele atuariam governadores, secretários estaduais de C&T, dirigentes das FAPs, governadores, representantes das agências de fomento federais e da comunidade científica.


Já a ênfase da extensão tecnológica é um traço marcante da atuação parlamentar de Holanda. Para ele, a política científica precisa ser massificada e associada à educação para cumprir sua função social. "É preciso conscientizar a academia para valorizar a extensão", disse.


Críticas


Aqui residem os dois pontos mais problemáticos do plano, na avaliação de membros da comunidade científica: introduzir mudanças na gestão científica dos recursos para C&T e mudar seu foco em prol da extensão tecnológica.


Alguns dirigentes, como o presidente da FAP de Pernambuco (Facepe), Diogo Simões; o secretário executivo de Tecnologia, Inovação e Ensino Superior da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente (Sectma) do mesmo estado, Anderson Gomes; e o diretor-presidente da FAP de Sergipe (Fapitec/SE), José Ricardo de Santana, louvaram a iniciativa de um plano que aumente os investimentos em C&T no Nordeste, mas fizeram ressalvas ao seu formato.


Em geral, as críticas concentram-se na ideia de criar uma nova instância burocrática - o CDCTN - para decidir sobre a aplicação dos recursos. "A operação dos fundos pela Finep já tem institucionalidade", opinou Santana, da Fapitec/SE. Para o secretário regional da SBPC no Ceará, Marcelino Pequeno, da forma como está apresentado, o plano cria um "ministério" em separado para o Nordeste.


Coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) de Fotônica, Cid Bartolomeu de Araújo avaliou por e-mail que "transferir recursos nacionais para decisão local pode ser muito perigoso a médio e a longo prazo", pois "a contaminação das avaliações por pressões políticas será inevitável", escreveu o físico da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).


De acordo com o deputado Holanda, os detalhes da gestão científica do novo modelo ainda estão em aberto. Sua ideia é debatê-los no âmbito do futuro conselho, num processo liderado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). Os pontos em aberto no termo de referência saltam aos olhos.


Em primeiro lugar, qual percentual dos fundos setoriais seria destinado ao Nordeste? Para Holanda, o tema tem que ser debatido com parlamentares do Norte e Centro-Oeste, usando como referência o tamanho das populações ou o número de instituições científicas. Em seguida, quem operaria o novo fundo?


Segundo o deputado, o "agente financeiro seria uma parceria entre o Banco do Nordeste (BNB) e a Finep", mas Holanda não abre mão da definição das prioridades por parte do futuro CDCTN - aí entra a questão no foco na extensão tecnológica.


O termo de referência do plano ocupa sete de suas 20 páginas com exemplos de programas e projetos. A ideia é que cada estado desenvolva um plano local de prioridades para levar ao conselho de gestão do novo fundo. No entanto, para Simões, da Facepe, é "um pouco precoce determinar finalidades" para o futuro fundo.


Embora Holanda garanta que a lista não esgota as possibilidades, a lista de projetos tende para a extensão tecnológica. "A extensão tecnológica é necessária para o país, mas isso não se confunde com a pesquisa", afirmou Pequeno, da SBPC no Ceará. Para o professor do Departamento de Computação da Universidade Federal do Ceará, os investimentos em extensão tecnológica não precisam ser feitos com mudanças na finalidade dos fundos setoriais, em detrimento da pesquisa básica.


Grupos locais


Para muitos, a diminuição das desigualdades depende do fortalecimento de grupos de pesquisa locais, trabalho de longo prazo. Anderson Gomes, da Sectma/PE, lembrou que a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), desde o segundo semestre do ano passado, universalizou a oferta de bolsas no Norte e Centro-Oeste. "O mesmo deve ocorrer em breve para a região Nordeste", escreveu por e-mail Gomes, que também é coordenador da área de Astronomia/Física da agência.


Simões, da Facepe, destaca que a descentralização da liberação de recursos por meio das FAPs já é feita pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pela Capes e pela Finep. Uma das possibilidades seria repassar para as fundações estaduais os recursos que "sobram" por falta de demanda qualificada.


Ao refutar a proposta, o deputado Holanda devolve o debate para a questão do foco na extensão tecnológica. "As FAPs estão preocupadas com segmento da mais alta importância, a pesquisa, mas elas não aceitam recursos destinados a projetos de extensão", disse o deputado, para quem o movimento de aprovação de leis estaduais de inovação é lento e esbarra na falta de capitalização das fundações.


O próximo passo na consolidação do plano será uma reunião dos governadores do Nordeste, marcada para o fim de março. À comunidade científica está colocada a possibilidade de participar do debate - que, com a agenda legislativa dominada pelas eleições, deverá ser longo.
(Vinicius Neder)


Nota da redação: Esta matéria foi publicada na edição 661 do "Jornal da Ciência", que tem conteúdo exclusivo. Informações sobre como assinar a edição impressa pelo fone (21) 2295-5284 ou e-mail jciencia@jornaldaciencia.org.br